13.9.12

Espetáculo traz experiências múltiplas para a cena

Todo processo artístico é transformador. Entre malabarismo, performances, bailados, encenações, além de um desenho de luz intenso e comunicativo, regado a uma trilha musical e de ruídos, não menos cheios de informações e contrastes, “Tá Rolando o Bafon” prova exatamente isso e você vai poder conferir. A estreia é nesta quinta-feira, 13, trazendo ao público a experiência conectada pelos artistas cênicos e técnicos que se envolvem há seis meses em seu processo de montagem. Não perca. Até domingo, sempre às 19h30, no Curro Velho, com entrada franca. 

Ninguém sai o mesmo depois de uma experiência assim. No fundo eu já sabia disso, mas foi maior a certeza que tive depois de tomar o depoimento de Rosângela Colares, Virginia Abasto, Pedro Olaia e Jaderlan Bezerra, os quatro artistas que estão em cena, e de Paulo Paixão, que toca a direção do espetáculo baseado em uma pesquisa de mestrado e contemplado pelo Prêmio Klauss Vianna de Dança (Funarte – 2011).

Fui a um ensaio da peça realizado há mais ou menos duas semanas em um clube situado no bairro da Marambaia. Aliás, lembro agora! Foi na primeira noite da tal Lua Azul, o que só colaborou para aumentar o clima onírico que pairou ali, quando via pela primeira vez o espetáculo, ainda sem figurino e com um ambiente cheio de cadeiras e mesas empilhadas, que em nada atrapalharam. Até gostei para fotografar, afinal a cena toda me trouxe a ilusão de estar num cenário de picadeiro daqueles circos de lona, com tudo bem comum e, aliás, diria que apropriado à proposta da montagem. 

“Tá Rolando um Bafon” encanta ao reunir performance, dança, circo e teatro, trazendo o espectador para o universo do sonho, cheio das cores e luzes que envolvem o mundo do artista, sempre em busca de seu reconhecimento perante uma sociedade, hoje mais do que nunca, repleta de banalidades.

Rosângela Colares - pesquisa em dança
A pesquisa de Rosângela Colares, em seu mestrado, teve como objetivo relacionar a questão do conflito e da diferença, como potencializadores da criação artística e acabou se transformando em projeto de montagem, prontamente aprovado e premiado pela Funarte. 

Mas para chegar à estreia, houve um longo processo de trabalho. Ainda no primeiro semestre, o elenco formado por artistas das quatro linguagens das artes cênicas, passou por fases de debate, pesquisa e laboratórios de integração e criação coletiva, que trouxeram resultados estimulantes para o fazer artístico de cada um dos envolvidos.

Rosângela atua no cenário da dança há mais de 20 anos em Belém. Mas é neste momento que ela está aprofundando suas inquietações. “A dança, historicamente, teve como bases e parâmetros a uniformidade, similitude, harmonia, proporção. Minha instigação é pensar que dança surge quando esses parâmetros são modificados e para mim, o Bafon tem muito a ver com isso”, diz. 

Virgínia Abasto é pesquisadora. A argentina radicada no Pará vem alguns anos atuando para a dignidade, a abertura de espaços, mercado e reflexões sobre a cultura e arte do circo em Belém. Ela destaca que ao fazer “Tá Rolando o Bafon” reconhece que está  se fechando um ciclo para que outro se abra em sua vida. 

Virgínia - da Argentina para Belém
“É um momento de poder apresentar em Belém uma vírgula daquilo em que acredito, o Circo. O Bafon trouxe um momento de fechar uma dívida comigo mesma, de poder treinar e apresentar números de circo Mais ainda não é circo, é uma ideia. Uma brisa de picadeiro”, conta ela que em cena trabalha com trapézio e tochas, entre outros truques e plasticidades corporais. 

Pedro Olaia vem se situando em investigações no campo da performance, mas ter chegado perto destas outras lingugens lhe trouxe um resultado de diálogos e maiores percepções e motivações para aprofundar seu trabalho e pesquisa. 

“É um momento de maior conhecimento da estrutura de outras linguagens cênicas, especificamente o circo e a dança. Anterior a este processo, eu não tinha experienciado nenhum espetáculo de dança ou circo. Acho que para o artista contemporâneo, é fundamental se libertar das ‘amarras’ de linguagens redondamente estruturadas, comportadamente delimitadas. Ele deve experienciar todas as linguagens artísticas, deve ser multi poli trans... deve ser multimidiático”, reflete. 

Jaderlan, sob as projeções de Olaia e Ferradaes
Jaderlan Bezerra foi "o cara" convidado para compor o ator de teatro. “Esse trabalho é uma superexperiência. 

Os conflitos de cada diferente e as diferenças de cada um em conflito resultaram, para mim, em um desencontro comigo mesmo. O processo me chacoalhou, virou-me ao avesso duas vezes. Trouxe-me à tona pseudoquestões pessoais, transformando-as em questões de fato, em algo palpável, ou, pelo menos, visível. Agora tenho questões”, conclui o ator. 

A direção é de Paulo Paixão, doutor em Semiótica pela PUC/SP e professor do curso de Dança da Escola de Teatro e Dança da UFPA – ETDUFPA e ex-orientador de Mestrado de Rosângela. Para ele, este bafon (bafão, notícia) está exatamente no modo como os intérpretes se engajam no espetáculo.

“Todos fazem um pouco de tudo, que é um desafio e ao mesmo tempo, indica que nestas linguagens, da maneira como concebemos o espetáculo, existe uma coisa em comum que é o jeito como o corpo se transforma num canal de intensidades para atingir o público pelo sensível”, esclarece. 

No centro, o ator e performerr Pedro Olaia
Juntos, eles abraçam a proposta de confronto e investigação em torno das ideias da dança e de suas atuações em cena. O acúmulo e a sobreposição de informação e gestos; as citações diferentes e até esdrúxulas como por exemplo misturar Clarice Lispector com DJ Serginho; Eguinha Pocotó, William Shakespeare e Britney Spears ou Dalva de Oliveira e Luiz Gonzaga, contribuem para isso. 

A ação em cena conta ainda com o figurino e visualidade de Maurício Franco; a sonoplastia e trilha musical, de Arthur Fonseca e a produção assinada pelos Produtores Criativos, que trazem uma nova concepção de trabalho coletivo para a produção de teatro em Belém.

Trajetória da bailarina traz a pesquisa como fio norteador

Para entender porquê Rosangela Colares embarcou nesta viagem bafônica, é legal saber um pouco mais sobre ela, que iniciou a carreira estudando ballet clássico com a professora Vera Torres, paraense que foi primeira bailarina do Ballet do Teatro Municipal de São Paulo. Mais tarde ela ainda passou pelas mãos de mestres russos como Eugênia Feodorova, Arcad Nikolaev e Oleg Sokolov, antes de se formar pelo curso técnico em dança da ETDUFPA, se graduar em licenciatura plena em dança pela mesma instituição atualmente cursar o mestrado em artes pelo programa PPGArtes/ICA..

Rosângela diz que paixão pelo ballet foi imediata
Como bailarina, atuou na Cia Ballet Arte, Grupo Coreográfico da UFPa, Farrabamba Cia de Dança e traz em seu currículo, participações em espetáculos como “Fugas”, “Dança popular”, “De cá pra lá”, “Cartas de mim”, entre outros. 

“Comecei a dançar por causa do ballet e me apaixonei pelas roupas, pelas sapatilhas cor de rosa, por todo aquele visual (principalmente do ballet romântico, tutus brancos, espíritos, fadas, o vôo da bailarina). 

Quando já era uma bailarina relativamente madura e conhecida em Belém, comecei a experimentar coisas que na época, final dos anos 1990 e começo dos 2000. Eu creditava que era dança contemporânea, coisa que não acredito mais”, conta. 

“Trabalhei com muita gente boa dessa cidade, Ricardo Risuenho e Marilene Melo, Waldete Brito e Eleonora Leal. Nessa mesma época conheci o Paulo Paixão, na época um professor baiano, recém chegado em Belém, e que começava a conhecer as pessoas. Ele montou para o Ballet Arte, grupo no qual eu atuava, um trabalho chamado “Segredo”. Depois disso nos separamos para nos reencontrar no curso de graduação da ETDUFPA, em 2008". Era o início de uma grande parceria...

Ficha Técnica

  • Direção: Paulo Paixão
  • Integrantes Criadores: Rosangela Colares; Pedro Olaia; Virginia Abasto; Jaderlan Bezerra
  • Figurino e Visualidade: Maurício Franco
  • Iluminação: Thiago Ferradaes
  • Vídeo: Pedro Olaia
  • Operação de sonoplastia/cooperação em trilha sonora: Artur Fonseca
  • Produção dos Produtores Criativos: Coordenação: Cristina Costa/ Produção: Andrea Rocha e Thiago Ferradaes/Assistência de produção: Leny Monteiro/Apoio: Marisa Santos/Assessoria de Imprensa: Holofote Virtual. 

Serviço
"Tá Rolando o Bafon". Temporada de 13 a 16 de setembro, sempre às 19h30, na Fundação Curro Velho – R. Professor Nelson Ribeiro, s/n. Entrada franca. Apoio Cultural: Fundação Curro Velho, Governo do Estado do Pará, Refry, Hiléia, Panificadora Estação do Pão. Agradecimentos: SINDIFES e In Bust Teatro com Bonecos/Casarão do Boneco. Mais informações: 91 8134.7719. Agendamento de grupos: 91 8896.2792 / 91- 8215.4956.

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