7.3.14

Galeria de arte se abre à produção dos Terreiros

"Nós de Aruanda - Artistas de Terreiro" já foi assunto aqui no blog. Arthur Leandro, envolvido na curadoria e organização nos falou sobre as perspectivas da exposição, cuja segunda edição será aberta nesta sexta-feira, 7, às 19h, e segue com programação diversa de 10 a 28 de março, sempre das 9h às 19h, na Galeria Theodoro Braga, do Centur. Abaixo, trecho de um dos textos de Aruanda, livro de crônicas de Eneida de Moraes, seguido de texto dos organizadores da mostra.

"Quando foi mesmo que ela chegou pela primeira vez a meus ouvidos, não sei. Era apenas uma palavra, mas trazia um cheiro violento de terra e de liberdade, gosto de fruta madura, uma palavra apenas, porém usando paladar e olfato. 

Por que me embalava tanto como se fossem os braços de minha mãe? Pés se arrastavam, corpos dançavam, vozes cantavam e ela vinha clara e sonora, não se explicando ou definindo, mas evocando lembranças, saudades, passado, distante país, tempos idos, mocidade, vida vivida... 

Aruanda é o país que sempre trazemos dentro de nós, país de Liberdade e de Paz, país sem desigualdades nem ódio, sem injustiças ou crueldades. (...) Aquele que carregamos como uma arma ou uma joia tão brilhante, pois foi por nós construído, vivido, criado, e por nós defendido. (...) Em Aruanda o lírio é mais lírio e as estrelas brilham com maior intensidade, porque tomamos parte direta na construção de toda a paisagem."

Eneida de Moraes (“Aruanda” [crônicas], Livraria José Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1957)

Aruanda é uma referência ao porto de São Paulo de Luanda, lugar de onde partiam os negros sequestrados e trazidos ao Brasil na condição de escravos, e a referência ficou na memória coletiva como o lugar onde se encontraria novamente a liberdade que vinha com as lembranças do continente de origem. Aruanda chama, Aruanda acolhe, Aruandas dão-se as mãos!

Nós de Aruanda, nossas Aruandas, nosso passado, nosso presente e nosso futuro! E ao mesmo tempo um tempo-lugar-fantasia-documento de nós, sobre nós. Nós que somos filhos e filhas de tantos santos quanto são os tempos das Áfricas amazônidas. 

Espaços-tempo reunidos para superar concepções que separam a arte da religiosidade e das tradições afro-brasileiras. Arte-Aruanda deve ser entendida como território tradicional negro que tem uma vontade imensa de transpor esse muro gigantesco que separa comunidades tradicionais do mundo branco normatizado.

Na contracorrente da indústria cultural, nós de Aruanda caminhamos em qualquer lugar e transitamos por estrada trilhada entre folhas que não separam a vida da arte, caminhamos para a política da construção do nosso lugar em todos os lugares. Misturados ao solo que nos abriga, somos parte desta terra preta, terra fértil, que alimenta novos brotos em território/terreiro que gera a vida!

Vidas exuberantemente diversas, selvagens, fortes, mágicas, e, porque não, criativas...   Verás de tudo um pouco, de memórias, objetos do cotidiano, oferendas, práticas ritualísticas, enfrentamento político, afirmação de identidades a construir sonhos, narrativas e poéticas.... Práticas artísticas diversificadas, e se por aqui a arte te parecer mais viva, é porque revertemos a violência colonizadora para nos tornarmos paisagem de reconstrução do cosmos cultural sustentado em afetos.

Arthur Leandro, Isabela do Lago e Aurilene Ferreira

Serviço
Exposição Nós de Aruanda - Artistas de Terreiro. Galeria Theodoro Braga - FCPTN (Centur). Abertura: 7 de março de 2014. Visitação: 10 a 28 de março de 2014, de segunda a sexta, das 9h às 19h. Entrada franca.

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