26.9.14

Alegoria da vida atual no teatro de rua do Galpão

Não sei vocês, mas estou na maior expectativa para ver, pela primeira vez, o Grupo Galpão em cena e em Belém, onde chegam pela primeira vez. A trupe mineira faz duas apresentações hoje (26) e amanhã (27), às 20h, na Praça da Bandeira, de seu espetáculo mais recente, “Os Gigantes da Montanha”, texto de Pirandello, com direção de Gabriel Vilela. A entrada é franca e a experiência, de engrandecimento de alma. A obra é uma alegoria sobre o valor do teatro, da poesia e da arte, e  sua capacidade de comunicação com o mundo moderno, cada vez mais pragmático e empenhado nos afazeres materiais. Eduardo Moreira, fundador do grupo, conversou com o Holofote Virtual na entrevista que vem após esta breve introdução sobre a trajetória do grupo.

Respeitado no Brasil e em vários outros  países, a história do grupo começa nos idos anos 1980, quando Teuda Bara, Eduardo Moreira, Wanda Fernandes e Antônio Edson se encontraram em Diamantina, durante o Festival de Inverno da UFMG. A experiência com os alemães Kurt Bildstein e George Froscher, do Teatro Livre de Munique, que trabalhavam com teatro de rua, lhes despertou o desejo de formar o grupo que logo montou A Alma Boa de Setsuan, de Bertolt Brecht.

A fama veio em 1992, com Romeu e Julieta, de Shakespeare, uma montagem típica de teatro de rua, recebendo os prêmios do júri popular do Festival Nacional de Teatro de Curitiba e Shell Especial, em 1993. A partir daí vieram inúmeras turnês, nacionais e internacionais, em temporadas, porém, curtas. Já no ano 2000, torna-se o primeiro grupo brasileiro a apresentar-se no Globe de Londres, famoso local onde se encenam apenas peças de Shakespeare, com a montagem de "Romeu e Julieta".

“Os Gigantes da Montanha”, que vamos ver logo mais, acontece após a montagem de dois espetáculos do grupo para textos do Tchékhov e adaptações de contos do autor russo para o cinema. 

Aos 32 anos de estrada, o grupo leva para a rua o verso erudito de Pirandello, autor conhecido por seus questionamentos com relação ao fazer teatral e aos elementos da carpintaria cênica.

Conduzi-lo para fora dos limites do palco italiano se traduz em mais um instigante desafio para o Galpão, que circula com o patrocínio da Petrobras, parceria estabelecida há mais de 10 anos.

As apresentações em Belém contam com a produção local dos Produtores Criativos, formado por Cristina Costa (In Bust), Nanan Falcão, Vandiléia Foro, Maurício Franco, Thiago Ferradaes, Andrea Costa, Milton Aires (Miasombra) e Fafá Sobrinho.

No elenco de "Os Gigantes da Montanha"estão duas atrizes mineiras, que acabaram de 'causar' na novela “Um Pedacinho do Céu”, na Rede Globo: Inês Peixoto, que no espetáculo interpreta a Condessa Ilse, protagonizando a trama ao lado de Eduardo Moreira, no papel de Cotrone, e Teuda Bara, que faz A Sonâbula. 

Também integram o elenco, Antonio Edson (Cromo), Arildo de Barros (Conde), Beto Franco (Duccio/ Doccia / Anjo 101), Júlio Maciel (Spizzi/ Soldado), Luiz Rocha (ator convidado/Quaquèo), Lydia Del Picchia (Mara-Mara), Paulo André (Batalha), Regina Souza (atriz convidada/Diamante/Madalena) e Simone Ordones (A Sgriccia).

“A formação atual de doze atores do Galpão vem de 1995 quando montamos o espetáculo 'A rua da amargura'. O grupo tem discutido bastante a necessidade de renovar-se, mas até agora, continuamos com a mesma formação”, disse Eduardo Moreira.

O ator concedeu entrevista ao Holofote Virtual, realizando a missão em trânsito, antes mesmo de partir de Açailândia, no Maranhão, onde o grupo ainda estava ontem se apresentando e realizando a oficina, que também acontecerá em Belém amanhã no Teatro Waldemar Henrique. 

O Galpão, que também fez apresentações em Imperatriz (MA) e no Estado do Tocantins, em Palmas e Araguaína, fecha aqui o ciclo dessa circulação. A seguir, ele fala da experiência do grupo e das expectativas para as apresentações em Belém, além dos novos passos que o Galpão tem a dar ainda este ano.

Holofote Virtual: São 32 anos de estrada e só agora chegando em Belém...

Eduardo Moreira: Era um sonho antigo. Há muito tempo que o Galpão planeja apresentar-se em Belém, mas os apoios para a viabilização não se concretizaram. A parceria com a Petrobras nos permitiu agora incluir a cidade numa turnê que incluiu as cidades de Palmas e Araguaína, no Tocantins e Imperatriz e Açailândia, no Maranhão.

Holofote Virtual:  Como tem sido esta circulação pela região?

Eduardo Moreira: Fizemos espetáculos incríveis para públicos bastante entusiasmados. Só em Açailândia tivemos mais de 3.000 espectadores na Praça do Pioneiro. Foi muito bonito ver a reação do público diante da fábula de Pirandello. Muitas pessoas nunca tinham assistido a uma peça de teatro e o mais emocionante foi perceber o sentimento de agradecimento nos olhos das pessoas.

Holofote Virtual:  Qual a estrutura com a qual vocês viajam?

Eduardo Moreira: Nós montamos uma estrutura completa de teatro com cenário, luz, som. O material é transportado numa carreta que nos acompanha por todas as cidades. Nossa montagem começa às sete horas da manhã e só termina na hora da apresentação.

Holofote Virtual: Como é viajar nestas condições, chegar num dia e montar tudo, fazer as apresentações, partir pra outra cidade...

Eduardo Moreira: É um trabalho duro que exige a presença de pelo menos doze carregadores, muita produção, ensaios de especialização vocal, teste de microfones, e passagem de cenas e de músicas. E, logo após a apresentação, tudo é desmontado e recolocado na carreta para seguir para outro destino.

Holofote Virtual:  Vocês também ministram uma oficina, como é o processo, sendo curto o tempo pra tanta experiência do grupo?

Eduardo Moreira: Faremos alguns jogos e exercícios que são parte de nossa prática teatral e mostraremos uma vivência de ensaio de um musical que estrearemos no próximo mês de dezembro. Acho que será uma boa oportunidade do público presente testemunhar nosso processo de criação.

Holofote Virtual:  Encenar este espetáculo de Pirandello...

Eduardo Moreira: Encenar "Os gigantes da montanha" na rua foi um grande desafio. Uma peça que é uma fábula tão carregada de poesia e lirismo e que tem um enredo bastante complexo e intrincado, muitas vezes pode parecer difícil e hermética para um público que não está acostumado às convenções do teatro.

Algumas adaptações dramatúrgicas foram acrescentadas como a inclusão de narrativas sobre o enredo. A música é um outro elemento que aproxima a montagem do espírito popular. O fato é que, depois de quase oitenta apresentações realizadas nas principais capitais do país e também em regiões como o vale do Jequitinhonha, a reação do público tem sido muito boa e bem acima das nossas expectativas iniciais.

Holofote Virtual: Expectativas para as apresentações em Belém... 

Eduardo Moreira: A melhor possível. Eu já ministrei uma oficina de teatro na cidade para atores, em Belém. Na época trabalhei com trechos da peça "O inspetor geral" de Nicolai Gógol, que depois viria a fazer parte do repertório do Galpão com direção de Paulo José. Assisti a espetáculos de Belém e já trabalhei com o querido Cacá Carvalho e, portanto, conheço um pouco, à distância, a realidade teatral dessa cidade que é um marco cultural do país e que tem um teatro de bastante qualidade.

Holofote Virtual: Depois da região norte vocês seguem pra onde, qual são os planos?

Eduardo Moreira: Temos uma temporada prevista para novembro em Belo Horizonte (no teatro Bradesco) e participações num festival em Florianópolis e na inauguração de um teatro em Jacareí, interior de São Paulo. 

Além disso, temos a estreia de nosso musical em dezembro e o lançamento de um importante material sobre a memória do grupo - 10 livros contendo os diários de montagens do Galpão desde "®moeu e Julieta" até "Os gigantes da montanha", 2 DVDs com a remontarem de “Romeu e Julieta” e "Os gigantes da montanha", além de um CD com as trilhas dos espetáculos "Till" e "Gigantes da Montanha". Temos, portanto, um resto de ano bastante cheio.

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