4.5.16

Coletivo Alfenim traz assuntos brasileiros à cena

Integrantes do Alfenim, coletivo teatral paraibano em circulação no Pará, pela Funarte Prêmio Myriam Muniz de Teatro e Petrobras, conversaram com a plateia, ontem, após a apresentação de “O Deus da Fortuna”, que ganha mais uma apresentação, hoje (4), às 20h, no Waldemar Henrique. Amanhã (5), eles estreiam “Quebra-Quilos”,  no mesmo espaço e horário, em Belém, para depois apresentá-lo, na sexta-feira, 6, em Castanhal, onde haverá oficina. Entrada franca.

Na platéia do Experimental Teatro Waldemar Henrique, além do público, estavam atores do Grupo de Teatro da Unipop e o ator e diretor de teatro Cláudio Barradas, que participaram da conversa. No bate papo, o dramaturgo e encenador da peça, Márcio Marciano, falou sobre a trajetória do grupo, fundado por ele em 2007, em João Pessoa e sobre os processos de estudos e pesquisa que norteiam a construção de seus espetáculos e ainda sobre a importância das políticas de fomento para a cultura no país.

O dramaturgo disse que o grupo busca sua dramaturgia autoral e própria e que o Alfenim constrói seus espetáculos dentro de um processo colaborativo. 

Ele faz o texto final e resolve a encenação, mas todos os artistas são envolvidos e participam da pesquisa e construção da cena, a partir de experimentações na sala de ensaio. É desse corpo a corpo e do material que são documentos, iconografias, filmes, literatura e dramaturgia clássicas e recortes de jornais, entre outros, que surge a cena.

Marcio Marciano é paulista e chegou a João Pessoa em 2006, depois de ter fundado e trabalhado por dez anos também com o grupo Cia do Latão, em São Paulo. A mudança para a capital da Paraíba foi provocada pela transferência de sua esposa, Paula Coelho, para dar aulas na universidade federal do estado.

Quando se mudou para o nordeste, ele diz que precisou estudar a região, seus aspectos históricos e culturais para então construir o que é hoje o Alfenim, que se fundamenta em assuntos essencialmente brasileiros. Ele juntou atores que estavam sem um grupo fixo e a partir daí desenvolveu oficinas nas quais surgiu o primeiro espetáculo de repertório, o “Quebra-Quilos”, que se baseia numa revolta, pouco conhecida dos brasileiros, que se desencadeou no interior da Paraíba e se espalhou pelo nordeste.

“Pouca gente sabe, mas foi esta revolta que antecipou o massacre de Canudos, mais de 20 anos antes”, comentou. Mas não pense que por se tratar de o assunto sangrento do espetáculo que estreia amanhã, em Belém, se norteia somente pela tragédia.

“Na nossa perspectiva o teatro tem que divertir e satisfazer esteticamente a plateia. Só não podemos esquecer que ele também tem caráter pedagógico de educar e produzir pensamento crítico sobre temas que nos dizem respeito, que debata os problemas que nos afligem enquanto cidadãos neste país”, disse.

Um bom espetáculo, de acordo com o diretor, deve refletir temas atuais a partir dos ensinamentos que a história promove. “Trabalhamos isso, porém, de forma lúdica e com humor, para construir um pensamento critico sobre a realidade”.

O Deus da Fortuna, que ainda pode ser visto nesta quarta-feira, 4, é uma fábula em corte oriental chinesa, que fala do processo de financiamento do capital. O espetáculo se passa em um dia, situado numa China imemorial, abordando um tema bem atual, o volátil capital.

“Ao mesmo tempo em que falamos de movimento na Bolsa de Valores, e num capital abstrato, estamos fazendo uma comédia de penetração muito grande, que atrai públicos bem diferentes, que gostam do que assistem. E os púbicos são diferentes em cada região do país. Ele se comunica através de camadas e varia. Ouvimos no sul um espanto em relação ao tipo de espetáculo que fazemos pois não usamos triângulo e nem chapéu de coro. Temos piano e violoncelo em cena, além do recorte oriental. É um espanto que se crie este espetáculo na Paraíba”, diz Márcio.

Pesquisa e incentivo à cultura brasileira 

Para ele, a cultura de modo geral no Brasil é negligenciada e sempre a primeira a ser cortada em momentos de crise, como esse que estamos vivendo, por exemplo. Márcio pontua, no entanto, que para além das leis de incentivo que colocam nas mãos dos diretores de marketing o direito de dizer o que deve ou não ser incentivado neste país, nos últimos anos houve incremento nas políticas culturais, que proporcionaram o desenvolvendo várias linguagens, dando acesso aos bens culturais. Ele cita estes incentivos em esferas estaduais, municipais e federais.

“Na Paraíba, temos o Fundo de Incentivo a Cultura Augusto dos Anjos, além de editais municipais, e os federais, pela Funarte. É através destes fomentos que o grupo consegue manter sua pesquisa e oferecer ao público uma alternativa a mais comercia que os de stand up e comédias que em geral reforçam preconceitos”, diz.

“Por isso as pessoas estão aprendendo a gostar mais de teatro, pois estas políticas permitem que se dê continuidade à pesquisa, que precisa de fomento do poder público para ser desenvolvida e manter os repertórios. 

É assim que formamos público e individual, o pensamento crítico”, pontua. É o que permite também ao grupo manter no repertorio os espetáculos. 

“Ficamos às vezes meses em temporadas. A cada mês com espetáculo diferente e acabamos incorporando discussões que estão quentes no momento. Em O Deus da Fortuna estamos debatendo muito do que está acontecendo, hoje e desde sempre, no Brasil. Fazemos ajustes, mas é inevitável abordar, já que o assunto é brasileiro”, finaliza.

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